O Perverso destrói sorrindo

Entrevista com a médica psiquiatra Marie-France Hirigoyen, especializada em assédio moral e psicológico. Marie-France Hirigoyen é autora, psiquiatra, psicanalista, vitimologista, e também professora de ética na Universidade de Paris.

“Muitos anos de consultas vendo gente psicológicamente anulada levaram-na a perceber um erro: “A psicanálise só considera aquilo que ocorre na cabeça do indivíduo, e se este se deixa agredir mentalmente, ele é visto como  um cúmplice masoquista. Mas isto não está correto, existe um agressor real que o fez em pedaços.”

E adverte: “Cuidado! Com o pretexto da tolerância nos tornamos indulgentes”. Nestes tempos em que o mais admirado é aquele que sabe desfrutar mais e sofrer menos, proliferam os perversos, gente que se engrandece destruindo os outros. Indivíduos ávidos de aprovação e admiração, manipuladores natos que primeiro seduzem e logo depois vampirizam. “Siga o meu conselho. Tire-os da sua vida. Não tem remédio”.

Se pode destruir alguém só com palavras?  Sim. Com zombarias, sarcasmos, rumores, olhares e insinuações; é o que se chama de “assédio moral”, e se dá na família, na empresa e entre casais.

Quem são os assediadores? Os perversos são pessoas que querem poder e que não tem escrúpulos em utilizar os outros, que para eles não são mais do que objetos.

E como são as vítimas? Pessoas que sentem compaixão pelos outros e que são muito dinâmicas. Pouco a pouco perdem o seu dinamismo e entram em confusão e desequilíbrio ao não entender o comportamento do perverso.

O perverso utiliza os fracos? Não. Suas vítimas costumam ter uma forte personalidade e inteligência, por isso ficam presas nas redes do jogo do perverso que desfrutam ao ver sua destruição moral.

Um assediador moral nasce assim ou se cria? Costumam ser pessoas que em sua infância foram tratadas como objetos: ou foram abusados, ou foram idolatrados pela mãe.

Estão doentes? Não. Enquanto tiverem uma vítima para descarregar sua perversão eles estarão perfeitamente equilibrados.

São felizes? São cruéis, não tem emoções, só lhes interessa as aparências e no fundo nunca estão satisfeitos.  Necessitam dos outros.

Como sanguessugas? Exato, roubam a vida, a força e a alegria dos outros por que eles mesmos não são felizes, e nem são capazes de se desenvolver.

Como é que age um perverso? Destruição sistemática da outra pessoa por um longo período de tempo através de subentendidos, alusões, desqualificações, desprezo, vazio. Uma sutil estratégia para confundir o outro. E se o outro se queixa, o perverso o acusa de ser muito sensível. Sempre negam o conflito.  Se não há culpa, não há sofrimento.

Por que caem em suas armadilhas? Além de ser muito sedutores, se mostram frágeis, sensíveis e necessitados, e nos dedicamos a lhes ajudar. Utilizam habilmente a linguagem para confundir o outro.

Como? Dão mensagens contraditórias; não terminam as frases que estão cheias de insinuações, de maneira que o outro nunca está seguro do que sentem.  Mentem frequentemente.

E são conscientes? Não, atuam assim para sobreviver, por que tem a impressão de que estão em perigo. Mas sabem quando passam dos limites. Jamais usam um comportamento abusivo se sabem que estão sendo observados.

São invejosos? Muito, esse sentimento os faz avançar, a sensação de que o outro tem algo que eles não têm.  Mas a sua inteligência é estratégica e destroem com sorrisos.

São “fortões”? Sempre se submetem a autoridade. São submissos ao poder mesmo que o critiquem.

Tem senso de humor? São mais sarcásticos e podem ser muito ácidos. E tem fobia de compromisso, a tudo que o que pode vincular ao outro, casamento, filhos… Temem ser invadidos.

Coitados. Tem cura? Não.  Enquanto tiver uma vítima eles não se deprimem e não tem problemas de consciência. Assim nunca procuram um especialista.

São persistentes com suas vítimas? Muito persistentes, necessitam que a vítima fique perto deles por que precisam dela. Se lhes abandonam se sentem mal, mas tendem logo a procurar outra.

Qual é a visão de mundo do perverso? Só lhes interessa o poder e o reconhecimento social, mas isso ele dissimula, se queixa frequentemente da vida e é muito negativo.

Se lerem essa entrevista, eles se reconhecerão? Não, verão os outros refletidos. Mas as pessoas ao seu entorno sim, elas os reconhecerão.

Como se livrar deles? É muito difícil por que o agressor nunca abandona a sua vítima e quando ela tenta ir embora ele a culpa.

E se é um inevitável colega de trabalho. Como conviver? Entendendo que seu comportamento é patológico e que não vai mudar. Se não puder se afastar dele, utilize a política do pato.

Do pato? Que todos os insultos e humilhações não grudem em você. Nunca se deve entrar no seu jogo, e na escalada de violência. O agressor quer que a vítima se converta também em agressor. Tenta inverter aparentemente a situação e demonstrar que o outro é violento.  São muito malévolos! Outro prazer do perverso é fazer a vítima perder a moral.

Como curar uma vítima? Normalmente faz falta que outra pessoa a faça ver que tipo de relação tem; que perca o sentimento de culpa e recupere a confiança em si mesma. O agressor se dedicou a fazê-la sentir que não é ninguém, que é incompetente, e ela fica com seu amor próprio muito devastado. Assim que perceber atitudes perversas, denuncie.

Um especialista faz falta? Sim, por que é muito importante mostrar a vítima qual é o seu ponto fraco, isso foi o que fez com que ela caísse nas mãos do assediador.

E qual seria o seu ponto fraco? Uma falta de confiança em si mesmo por causa de uma ferida da infância. O perverso é muito hábil em perceber a fragilidade do outro.

Como se defender legalmente? O mais importante é educar em dizer não e formar especialistas que possam intervir. No mundo laboral é preciso criar uma lei contra o assédio e já estamos nisso”.

Por Ima  Sanchis, La Vanguardia


Tradução e adaptação do original por Silvia Rawicz
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